segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

"UM PAI NATAL DE "CHICULATE",por Fernando Assis Pacheco

 Era visível a diferença entre os dois: o António Fernando bem vestido, desempenado, falador; o José Aurélio pequeno, calado como um rato, envergonhado, trajando uns restos de roupa cosipados de qualquer maneira. Falou-se do último Natal, e ao filho do homem que trabalha nas rutes luziram-lhe os olhos:
«Os meus pais mandaram-me uma botas!»
 Não umas botas vulgares, umas botas…
  «…novas!»
O José Aurélio, esse, ganhou bem menos:
«Deram-me um Pai Natal de chiculate.»
  «E mais nada?»
 «O Pai Natal, pois.»
Também se diferenciavam na comida, como eu já esperava. Assim, o António Fernando tinha dado bastante ao dente no dia anterior: ao almoço caldo, massa e feijoada com salpicão, ao jantar caldo de novo, nabiça e toucinho. O José Aurélio ficara-se por pão com naco de chouriço ao almoço, para atacar caldo e morcela antes de se deitar.
   Às tantas o José Aurélio saiu a correr de ao pé de nós, e pensámos, os grandes: envergonhou-se outra vez. Nada disso, nada disso – no minuto seguinte estava de volta com um pão (e chouriço, não muito).
Moncorvo - zona quente na terra fria(In jornal REPÚBLICA ,de Março de1974;e
In TORRE DE MONCORVO , Março de 1974 a 2009, de Fernando Assis Pacheco ,Leonel Brito, Rogério Rodrigues, edição da Câmara Municipal de Torre de Moncorvo).

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