quinta-feira, 21 de novembro de 2013

História da República – Volume I – A Ideia e a Propaganda, de Raúl Rêgo

Resumo:
Entre 1910 e 1926, ensaiou-se em Portugal a primeira experiência democrática e republicana. Mas o que sabemos nós sobre a história desse período? O que foi, de facto, a Primeira República Portuguesa? Um caos partidário e financeiro, um regime corrupto e anárquico, como insistentemente foi apregoado pela ditadura de Salazar?
No centenário do nascimento do jornalista, ensaísta e político Raúl Rêgo, reedita-se o primeiro de cinco volumes da sua mais importante obra, que, fruto de um rigoroso trabalho de investigação histórica, repõe a verdade dos factos. Inclui o prefácio original de Mário Soares.

Biografia do autor:
Raúl Rêgo, jornalista, ensaísta e político, nasceu em Morais (Macedo de Cavaleiros) a 15/04/1913 e faleceu em Lisboa a 1/02/2002.
Formado em Teologia, não chegou a ordenar-se padre. Depois de uma curta passagem pelo ensino, entrou para o jornalismo: Seara NovaReutersJornal do ComércioDiáriode LisboaRepública, A Luta, estes dois últimos como director, entre outras colaborações.
Dirigiu os Serviços de Imprensa das campanhas de Norton de Matos e Humberto Delgado e foi candidato a deputado pela oposição, em 1965 e 1969.
Fundador do Partido Socialista. Depois da revolução do 25 de Abril, foi Ministro da Comunicação Social, deputado às Constituintes e deputado à Assembleia da República, em várias legislaturas.
Maçon, foi Soberano Grande Comendador e Grão-Mestre, do Grande Oriente Lusitano.
Da sua bibliografia, constam publicações no campo da política, da bibliofilia, da Inquisição e da República, como: Para um Diálogo com o Sr. Cardeal Patriarca (1969, que lhe valeu a terceira prisão), Diário Político (1969), Os Políticos e o Poder Económico (1969), O Processo de Damião de Goes na Inquisição (1971), O Último Regimento da Inquisição Portuguesa (1971), Os Índices Expurgatórios e a Cultura Portuguesa (1982), O Último Regimento e o Regimento da Economia de Goa (1983) e a História da República (1986-1987).

Prefácio à 1.ª edição:
A história da República Portuguesa está por fazer. Há obras monográficas muito interessantes; mas não há nenhuma obra de conjunto. Luís de Montalvor, rodeado de excelentes colaborações, lançou a sua monumental História do Regime Republicano. Mas ficou no 5 de Outubro de 1910: na ideia republicana e no movimento da Propaganda. Carlos Ferrão publicou uma instrutiva História da República, na Editorial O Século, que termina no mesmo ponto: precisamente onde se esperava que começasse. Temos ainda os suplementos à História de Portugal de Barcelos – um meramente factual, com inegável interesse, que se deve à probidade do Professor Damião Peres; outro, que não se eleva acima de um trabalho propagandístico, de inferior qualidade: simplesmente lamentável. Não creio que exista nenhuma outra história de conjunto da República, embora ultimamente a historiografia portuguesa tenha sido enriquecida com excelentes trabalhos parcelares sobre os movimentos de ideias, as lutas sociais e alguns períodos, acontecimentos e figuras mais significativas, entre 1910 e 1926 – dezasseis anos perfeitamente decisivos para a interpretação e conhecimento da problemática contemporânea portuguesa.
Raúl Rêgo, começando também nas origens das origens, isto é, nos alvores do século XIX, dispôs-se a preencher essa lacuna, lançando mãos ao que deve ser o livro da sua vida, pelo escrúpulo e paixão que nele tem posto. Não sendo obviamente neutral, visto que se trata de um republicano confesso, admirador dos grandes vultos da nossa Primeira República, pôs contudo na sua História da República Portuguesa a isenção, o profissionalismo e a independência crítica de que tem dado sobejas provas ao longo da sua vida, de grande jornalista, de escritor e de exemplar cidadão.
Bibliógrafo e curioso dos enigmas da nossa História, coleccionador de velhos papéis e de folhetos que mais ninguém possui, polígrafo, historiador da Inquisição – sobre a qual deve ter uma das mais ricas bibliotecas privadas –, latinista e erudito, Raúl Rêgo foi acumulando, ao longo dos anos da sua brilhante carreira de jornalista, esmaltada por actos de uma incomparável coragem cívica, uma experiência única sobre a História da República, conhecendo pessoalmente muitos dos seus principais intervenientes e colhendo informações directas, depoimentos em primeira mão, de amigos próximos das personalidades com as quais não chegou a relacionar-se pessoalmente.
Poucos terão, como ele, tanta documentação, reunida pacientemente ao longo dos anos, de alfarrabista em alfarrabista, depoimento após depoimento, sobre o conturbado período da Primeira República. Não será assim de estranhar que a sua História lance nova luz e ofereça interpretações originais para um período da nossa História que o fogo cruzado das paixões não tem permitido, até agora, encarar com total serenidade e desprendimento.
Durante quase meio século a propaganda sistemática dos arautos da ditadura exerceu-se a denegrir e caluniar os homens da nossa Primeira República e as suas mais cristalinas intenções, transformando, um período decerto polémico mas dos mais interessantes e fecundos da nossa História na «balbúrdia sanguinolenta» a que se referiu o historiador oficial do regime deposto em 25 de Abril, João Ameal. Estamos agora em condições de poder estudar a realidade republicana na perspectiva e com a distância que o tempo confere a todas as coisas. E de reconstruir esse período histórico tão denso com serenidade e boa fé. As jovens gerações têm interesse em conhecer, com objectividade, as lutas apaixonantes em que se envolveram os seus avós e que têm tanto a ver ainda com os problemas que hoje vivem, felizmente em liberdade, como eles viveram, mas não as gerações, imediatamente posteriores, as que conheceram a ditadura, submetidas como estiveram à violência da censura e às discriminações e perseguições políticas. A essas pertenceu Raúl Rêgo, sabendo manter sempre – honra lhe seja – bem alto o facho da independência moral e da dignidade cívica.
História da República Portuguesa que agora nos oferece representa decerto um enorme labor de pesquisa, de investigação original e de interpretação, mas não pode também deixar de reflectir essa vivência profunda do homem que toda a vida amou entranhadamente a liberdade e foi obrigado, décadas a fio, a viver em ditadura, animado tão-só pelo exemplo honrado dos homens da Primeira República, eles também, na sua esmagadora maioria, fiéis até ao fim aos seus ideais patrióticos de liberdade e de justiça social.

Mário Soares 

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